Inclusão digital depende de investimentos em educação



Estudo realizado na Escola de Comunicações e Artes avalia centros públicos de acesso gratuito à Internet

Uma pesquisa realizada na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP mostra que grande parcela da população ainda não tem acesso à internet. “Em 2007, cerca de 70% dos brasileiros nunca havia acessado a internet”, afirma a jornalista Mariana Reis Balboni. Autora do estudo de doutorado Por detrás da inclusão digital: Uma reflexão sobre o consumo e a produção de informação em centros públicos de acesso à Internet no Brasil, Mariana acredita que apenas o aumento dos investimentos em educação poderá garantir acesso à rede mundial dos chamados “excluídos digitais”.

“São pessoas de baixa renda que não dispõem de recursos materiais nem de conhecimento para acessar, interagir, e se apropriar da rede. Moram em comunidades caracterizadas por uma forte exclusão social e, que conseqüentemente, tiveram uma trajetória educacional deficitária e limitada”, relata.

Para a jornalista, que é mestre em ciência da Comunicação pela Universidade de Montreal, no Canadá, a exclusão digital é somente mais uma vertente da exclusão social. Para combatê-la não basta o acesso à internet, mas sim um plano nacional de inclusão digital que leve em consideração o investimento em capacitação tecnológica e no letramento de novos usuários de internet.

O foco do estudo foram os centros públicos de acesso (CPAs) gratuito à internet chamados de telecentros comunitários e operados unicamente pelo governo, independente das denominações diferenciadas que os mesmos possuem localmente. Em sua grande maioria, os telecentros são resultado de políticas públicas do governo federal, estadual e municipal, muitas vezes em parceria com entidades do terceiro setor e de empresas privadas. “Além de prover acesso à internet, os CPAs são pontos de encontro e proporcionam um espaço para reflexão coletiva”, ressalta a pesquisadora.

Para a pesquisa, foram selecionados três programas de inclusão digital: o Acessa São Paulo, do Governo do Estado de São Paulo, que mantinha 178 unidades na época, e no qual foram investigadas duas unidades, uma na Capital e outra na cidade de Piracicaba; e dois programas municipais, o Digitando o Futuro, em Curitiba, considerada cidade-modelo pelos bons indicadores sociais e de infra-estrutura urbana, com 48 unidades; e o Telecentros Porto Alegre, com 58 na capital gaúcha, em 2005.

A pesquisadora optou por entrevistas com personalidades relacionadas à concepção e desenvolvimento de projetos de inclusão digital no Brasil, identificados como mentores, e com coordenadores e monitores dos programas avaliados, além de questionários online com os usuários dos CPAs, aplicados via internet ao longo de duas semanas, em um total de 84. “As entrevistas com mentores, coordenadores e monitores seguiram um roteiro semi-dirigido, dentro das categorias de análise definidas, e com os usuários do CPA usamos um questionário fechado online”, conta.

Identificando interesses

Os temas investigados foram o conceito de Inclusão Digital (ID), os objetivos dos programas de ID, o impacto da internet no consumo e na produção de informação, a contribuição dos programas de ID para os desenvolvimentos social, econômico e político das comunidades de baixa renda (oportunidades de geração de renda e emprego, de educação, acesso à informação e cultura, articulação social e cidadania) e os benefícios para a comunidade. Foram identificados também os interesses políticos e econômicos por trás da inclusão digital. “O discurso dos entrevistados mostra claramente que são as motivações políticas que vêm guiando o desenvolvimento de CPAs e de iniciativas de inclusão digital no País”, afirma a pesquisadora.

No caso de monitores e internautas, o simples acesso à internet representa uma mudança significativa na sua relação com o mundo, mesmo que a rede seja usada como um simples instrumento de comunicação mais direta e geral. “Coordenadores e gestores possuem aspirações mais amplas com relação ao potencial da ferramenta”, aponta. “O abismo entre as expectativas indica o sério problema da escolaridade no País”.

A questão do letramento e da apropriação tecnológica, necessárias para a produção do conhecimento, permanecem como pontos centrais a serem solucionados num País em desenvolvimento e que possui sérios problemas sociais, como o Brasil. “A pesquisa mostra como o simples acesso não garante que a informação seja processada, assimilada, e que se transforme em conhecimento”, explica.

“Mais do que fornecer acesso a computadores conectados à internet, o grande desafio da inclusão digital é possibilitar que a população de baixa renda, ou com poucas oportunidades de acesso a esses recursos, utilize esta tecnologia e as informações que nela circulam em seu benefício para transformar a sua realidade e a da comunidade onde vive.”

Cenário da exclusão

De acordo com a pesquisa, apenas 15,6% da população mundial possui acesso à internet, sendo que na América do Norte e Europa, 66% da população tem acesso à rede. Na América Latina e África as taxas de penetração da internet são 15,5% e 3,6%, respectivamente. (Fonte: Information Economy Report da ONU, 2006).

Ainda segundo o estudo, no Brasil 67% da população – pouco mais de 100 milhões de brasileiros – nunca acessou a rede. Entre os internautas, apenas 15,5% são das classes D e E, percentual que representa 7,9 milhões de pessoas. (Fonte: CGI.br, 2006).

Para a pesquisadora, “os centros públicos de acesso, em especial, os comunitários, continuam sendo um ponto de apoio importante para os jovens e sua comunidade, contudo novas formas de inclusão precisam ser desenvolvidas para abarcar também a grande quantidade de adultos e iletrados que parecem não se sentir à vontade nestes ambientes de acesso.”

Mariana Balboni atualmente é responsável pela produção de estatísticas e análises sobre o uso e desenvolvimento da internet do Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e Comunicação (Cetic.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), formado por representantes do governo, setor empresarial, terceiro setor e da comunidade científica e tecnológica ligada ao tema.

Da USP Online



04/18/2008


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