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O Mal Secreto
(Zuenir Ventura)

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Quando a editora Objetiva lançou a série Plenos Pecados em 1998, proporcionou aos leitores brasileiros uma oportunidade estimulante tanto para o público quanto para o criador: a obra sob encomenda. Feita dentro dos limites de um tema proposto, a coleção reuniu nomes como Zuenir Ventura, José Roberto Torero, João Ubaldo Ribeiro e Luís Fernando Veríssimo que abordaram nessa proposta temática o mote dos sete pecados capitais ? inveja, luxúria, avareza, preguiça, ira, soberba e gula. O primeiro volume que me tentou foi Mal Secreto (assinado por Ventura) que trata da inveja. Pela inegável condição de pior dos pecados, a inveja sempre será um tema instigante. E é sobre ela que gostaria de tecer algumas considerações.

Partindo do princípio de que vivemos em um mundo cada vez mais cínico, a inveja parece ser um sentimento que, se eu não me engano, permeia cada vez mais as relações humanas ? ainda mais se a considerarmos como um produto direto da egolatria disseminada pela publicidade. Acho que nem no tempo das monarquias absolutas e dos grandes impérios se invejou tanto. Se antes, os ideais de poder, beleza, sabedoria e glória estavam separados da grande maioria pelas segmentações de classes, castas e até raças, hoje esses bens invejáveis são contemplados num clicar de mouse ou num apertar de controle remoto. Pior do que visíveis, eles tornaram-se obrigatoriamente invejáveis, posto que os que não os invejam geralmente são alcunhados de fracassados.

Muitos autores já trataram desse tema, como, por exemplo, René Descartes que afirmou que o que é ?habitualmente mais invejado é a glória, pois embora a dos outros não impeça que possamos almejá-la, no entanto, às vezes torna o seu acesso mais difícil e encarece-lhe o valor?. De fato, a batalha dos invejosos seria menos árdua se os parâmetros não existissem. Os bem-sucedidos conseguem, a um só tempo, ser modelo do que se inveja e obstáculo para o que se almeja porque a comparação, nesse campo, é sempre inevitável e fatal. Talvez por isso, um pensador da envergadura de Giovanni Papini tenha escrito que ?a melhor vingança contra aqueles que me pretendem rebaixar consiste em ensaiar um vôo para um cume mais elevado?. É que a sina do invejoso parece ser sempre a de perseguir aquilo que não tem ou não é e, portanto, nada mais desgastante para seu espírito do que o sucesso do alvo que inveja.

Na seara da luta entre invejosos e invejados, torna-se comum os primeiros fazerem uso de difamações, calúnias e toda sorte de ardil para atingirem o que desejam, sejam cargos, bens, ou até cônjuges. Em algumas situações, é curioso notar como ?o indivíduo verdadeiramente sagaz serve-se da própria difamação para retocar melhor o seu retrato e suprimir as sombras que lhe afetam a luz?, como revela Papini em seu ?Relatório Sobre o Homem?. O invejoso torna-se, sem querer, o colaborador da sua perfeição, proporcionando-lhe as tintas com as quais o quadro do bem-sucedido passa a ter cores ainda mais fortes, brilho até mais intenso, valor certamente maior.

Em um artigo intitulado ?Dialética da inveja?, de 26 de agosto de 2003, Olavo de Carvalho analisa o tema com uma precisão anatômica. Logo de cara, disseca o pecado nessas palavras: ?a inveja é o mais dissimulado dos sentimentos humanos, não só por ser o mais desprezível, mas porque se compõe, em essência, de um conflito insolúvel entre a aversão a si mesmo e o anseio de auto-valorização, de tal modo que a alma, dividida, fala para fora com a voz do orgulho e para dentro com a do desprezo, não logrando jamais aquela unidade de intenção e de tom que evidencia a sinceridade?. Pode haver definição mais coerente? Esse raciocínio pode ser comprovado na simples lembrança de alguma situação que você, leitor, possa ter de um caso clássico de inveja. Geralmente o invejoso tem uma percepção distorcida de si mesmo. Essas vozes dissonantes da qual fala Olavo são as vozes de uma auto-imagem equivocada, de uma falta de senso crítico sobre si mesmo, o que provoca o extremismodos valores para mais ou para menos (ou para ambos ao mesmo tempo). Quem inveja se acha merecedor do mérito do outro, mas é, mesmo que em um nível inconsciente, sabedor da sua mediocridade. Pode haver algo mais triste?

Voltando ao livro de Zuenir Ventura, o autor em sua pesquisa para a obra encontrou conceitos os mais variados para a inveja e, antes de entrar na ficção, introduz o tema com pérolas como essa: ?a inveja detesta a competição, exceto quando sabe que vai ganhar?. Seguindo esse raciocínio é possível entender os procedimentos de um invejoso autêntico, aquela figura meio gente, meio sombra que trafega nos bastidores aspirando o palco, arrasta correntes no palácio onde sonha ser rei, segura vela pelo parceiro alheio. A propósito, se eu tivesse de definir em uma frase o tema, diria que a inveja é a primeira amiga do alheio, afinal, não deixa de, assim como o ladrão, tentar tomar o que é do outro.

O grande trunfo do livro, pelo menos para mim, é a forma hábil como Ventura consegue mesclar realidade e ficção na estória de "Kátia", uma jovem perturbadora e voluptuosa que o autor conhece num terreiro de umbanda da Baixada Fluminense e protagonista de uma instigante trama de inveja com conseqüências trágicas. Com perdão do trocadilho, uma habilidade invejável desse escritor que também é jornalista e professor universitário há quase quarenta anos.



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