A Escola Das Facas
(João Cabral de Melo Neto)
Nesta obra, lançada em 1980, João Cabral de Melo Neto mantém a poética da objetividade e do rigor, depurando-se em variações infinitas sobre as mesmas bases temáticas.
No poema "Descoberta da Literatura", integrante da obra, João Cabral retoma o ambiente da sua infância:
No dia-a-dia do engenho, toda a semana, durante, cochichavam-me em segredo: saiu um novo romance. E da feira do domingo me traziam conspirantes para que os lesse e explicasse um romance de barbante. Sentados na roda morta de um carro de boi, sem jante, ouviam o folheto guenzo , a seu leitor semelhante, com as peripécias de espanto preditas pelos feirantes. Embora as coisas contadas e todo o mirabolante, em nada ou pouco variassem nos crimes, No amor, nos lances, e soassem como sabidas de outros folhetos migrantes, a tensão era tão densa, subia tão alarmante, que o leitor que lia aquilo como puro alto-falante, e, sem querer, imantara todos ali, circunstantes, receava que confundissem o de perto com o distante, o ali com o espaço mágico, seu franzino com o gigante, e que o acabassem tomando pelo autor imaginante ou tivesse que afrontar as brabezas do brigante. (E acabaria, não fossem contar tudo à Casa-grande: na moita morta do engenho, um filho-engenho, perante cassacos do eito e de tudo, se estava dando ao desplante de ler letra analfabeta de curumba, no caçanje próprio dos cegos de feira, muitas vezes meliantes. )
A escola das facas é sobretudo um poema de amor a Pernambuco e à Andaluzia. Duas regiões retratadas de muitas maneiras na obra do poeta e, agora de maneira cristalina na extensão de quase todo o livro, em poemas trabalhados com um raro poder de criação, e um sentimento transbordante, mas numa economia de linguagem de arrepiar:
Cortaram Pernambuco em prancha longa e estreita no Brasil nordestino de que era sabre e testa. Cortaram em trampolim, os seus nativos herdam o saltar a que incita a mola que o entesa e dá ao salto o impulso que mais longe projecta, e atira para longes do que nele for cela.
O poeta exige uma maior participação do leitor. Não é uma poesia fácil mas, como bem observou o ensaísta Óscar Lopes, «o leitor atento sente como que um repto permanente ao que já descobriu entre si e o mundo».
O último poema do livro, que intitulou carinhosamente e fielmente Autocrítica, enfeixa numa secura exemplar sua paixão Pernambuco-Andaluzia:
Só duas coisas conseguiram (des)feri-lo até a poesia: o Pernambuco de onde veio e aonde foi, a Andaluzia. Um o vacinou do falar rico e deu-lhe a outra, fêmea e viva, desafio demente: em verso dar a ver Sertão e Sevilha.
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