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O Mito
(Carlos Drummond de Andrade)

Sequer conheço fulana,

Vejo fulana tão curto

Fulana jamais me vê,

Mas como amo fulana.



Amarei mesmo fulana?

Ou é ilusão de sexo?

Talvez a linha do busto,

Da perna, talvez o ombro.

Amo fulana tão forte,

Amo fulana tão dor,

Que todo me despedaço

E choro,menino, choro



Mas fulana vai se rindo...

Vejam fulana dançando

No esporte ele está sozinha

No bar, quão acompanhada.



E fulana diz mistérios,

Diz marxismo, rimmel, gás.

Fulana me bombardeia,

No entanto sequer me vê.



E sequer nos compreendemos,

É dama de alta fidúcia,

Tem latifúndios, iates,

Sustenta cinco mil pobres,



Menos eu...que de orgulhoso

Me basto pensando nela

Pensando com unha, plasma,

Fúria, gilete, desânimo.



Amor tão disparatado,

Desbaratado é que é...

Nunca a sentei no meu colo

Nem vi pela fechadura.



Mas sei quanto me custa

Manter esse gelo digno,

Essa indiferença gaia, e não gritar:vem, fulana!



Como deixar de invadir

Sua casa de mil fechos

E sua veste arrancando

Mostrá-la depois ao povo



Tal como deve ser:

Branca, intata, neutra, rara,

Feita de pedera translúcida,

De ausência e ruivos ornatos.



Mas como será fulana,

Digamos, no seu banheiro?

Só de pensar em seu corpo,

O meu se punge...pois sim.



Porque preciso do corpo

Para mendigar fulana,

Rogar-lhe que pise em mim,

Que me maltrate...assim não.



Mas fulana será gente?

Estará somente em ópera?

Será figura de livros?

Será bicho? saberei?



Não saberei? só pegando,

Pedindo: dona, desculpe,

O seu vestido, esconde algo?

Tem coxas reais? cintura?



Fulana às vêzes existe

Demais: até me apavora.

Vou sozinho pela rua,

Eis que fulana me roça.



Mas não quero nada disso.

Para que chatear fulana?

Pancada na sua nuca

Na minha que vai doer.



E daí não sou criança

Fulana estudo meu rosto

Coitado: de raça branca

Tadinho: tinha gravata



Já morto, me quererá?

Esconjuro, se é necrófila...

Fulana é vida, ama as flores,

As artérias e as debêntures.



Sei que jamais me perdoara

Matar-me para servi-la.

Fulana quer homens fortes

Couraçados, invasores.

Fulana é tão dinâmica

Tem um motor na barriga.

Suas unhas são elétricas,

Seus beijos refrigerados,



Desinfetados, gravados

Em máquina multilite.

Fulana, como é sadia!

Os enfermos somos nós.



Sou eu, o poeta precário

Que fêz de fulana um mito

Nutrindo-me de petrarca,

Ronsard, camões e capim;



Que a sei embebida em leite,

Carne, tomate, ginástica

E lhe colo metafísicas,

Enigmas, causas primeiras.



Mas, se tentasse construir

Outra fulana que não

Essa de burguês sorisso

E de tão burro esplendor?



Mudo-lhe o nome: recorto-lhe

Um traje de transparência;

Já perde a carência humana

E bato-a; de tirar sangue.



E lhe dou todas as faces

De meu sonho que especula;

E abolimos a cidade

Já sem peso e nitidez.



E vadeamos a ciência,

Mar de hipóteses.a lua

Fica sendo nosso esquema

De um território mais justo.



E colocamos os dados

De um mundo sem classe e imposto;

E nesse mundo instalamos

Os nossos irmãos vingados:



E nessa fase gloriosa,

De contradições extintas,

Eu e fulana, abrasados,

Queremos...que mais queremos?



E digo a fulana: amiga,

Afinal nos compreendemos.

Já não sofro, já não brilhas,

Mas somos a mesma coisa



( uma coisa tão diversa da que pensava que fossemos.)










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