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Hermano
(Indisponível)

Seu nome - nunca se soube,

nem ele mesmo sabia.

Numa noite muito fria

deu ô de casa na estância.

Vinha de longa distância

dos fundos da noite grande,

mas nos galpões do Rio Grande

isso tem pouca importância.



Ninguém lhe perguntou nome

nem lugar de procedência

que vinha de outra querência

se via no sufragante,

um buenas noites vibrante

de campeira fidalguia

e a galponeira franquia:

- ... Apeie... e chegue pra diante!



O chapéu com barbicacho,

negra e comprida melena,

pele queimada, morena

sem luxos na vestimenta,

bombacha de brim - cinzenta,

adaga e faca à cintura

e um olhar misto ternura

com lampejos de tormenta.



Mi nombre es Hermano, hermanos

disse - enquanto chimarreava

à peonada que escutava

mui atenta - por sinal,

e no mesmo tom casual,

palmeando a cuia de mate,

afirmou como arremate:

- Soy de la banda Oriental!



Desde essa noite o Hermano

ficou na estância - ajudando,

que o índio que anda cruzando

não se ajusta como peão,

vai ficando no galpão

- a velha casa reiúna -

onde os párias sem fortuna

buscam calor de fogão.



Sempre alegre e prestativo,

naquele meio dialeto,

era um gaúcho completo,

de ação pronta e destorcida,

demonstrando em qualquer lida

que era desses campechanos

que já nasceram vaqueanos

dos mil atalhos da vida.



Depois que se enforquilhava

no seu basto castelhano

nem o bagual mais tirano

sacava o índio dali.

Aos gritos de ibi-bi-bi,

ia surrando cruzado

pulando mais que dourado

nas enchentes do Ibicuí!



Cantava uma flor de truco,

à velha moda gaúcha

e num jardeio - qüe pucha,

sempre saía primeiro,

corredor mui tarimbeiro,

desses com sete sentidos

que até parecem nascidos

nas cruzes do parelheiro.



Laçava... e como laçava,

de a pé como de a cavalo,

tanto fazia no pealo,

ser sobre-lombo ou cucharra;

companheiro numa farra

dos que não refugam nada

e que mão aveludada

pra pontear uma guitarra.



Quando cantava se via

naquele olhar machucado

o pensamento empacado

nalguma reminiscência,

talvez a velha querência

longe na barra pampeana...

talvez alguma paisana

desgarronada na ausência...



Numa milonga macia,

numa cifra - num estilo

nunca se viu como aquilo

tamanha fidelidade,

ora olfateando saudade

numa nostalgia langue;

ora farejando sangue

num berro de liberdade.



Quando os dedos se perdiam

entre a quarta e a bordona

pareciam vir à tona

barbarescsa ressonâncias,

clarins furando distâncias

num último chamamento

e laços cortando ventos

no amanhecer das estâncias.



Depois amaciava o tranco

com patas aveludadas

e evocava madrugadas

com luas e meias-luas;

pôr-de-sóis nas pampas nuas

com romances proibidos

nos pelegos estendidos

para divãs das chiruas!



Sábado encilhava o baio

rumbeando aos ranchos da estrada,

beber ternura comprada,

onde os párias vão beber,

pois nesse meio viver,

o índio sem parador,

nunca encontra o bebedor

da sanga do bem querer.



Foi num Domingo de tarde,

ao retornar de uma andança,

a noite caía mansa

e o paisano vinha sério,

o pensamento gaudério

perdido longe... distante,

sem saber que, logo adiante,

ia enfrentar o mistério.



Quando embicava no passo

que faz fundo na invernada,

já na boca da picada,

o baio parou-se um gato,

bufou com espalhafato,

como prevendo tragédia,

o índio bancou na rédea,

já meio dentro do mato.



Ouviu um - morre bandido

dos covardes, de emboscada,

já na primeira trovoada

planchou-se o baio cabano.

Baleado embora, o Hermano,

ao se apartar do lombilho

vinha puxando gatilho

dum trinta e oito orelhano.



Seis tiros dados no rumo

e um alarido de morte.

Depois, a sangueira forte

e um frio que vinha do miolo

mas o índio era crioulo,

teve um sorriso esquisito:

- não ia morrer solito,

pra o taura, é sempre um consolo.



E ajoelhado, atrás do baio,

parceiro de mil jornadas,

já de pupilas vidradas

pela morte repentina,

passou-lhe a mão pela crina,

como quem nana criança

e um arrepio de vingança

escureceu-lhe a retina.



Com três ou quatro balaços

bordando a pele morena,

nem ouvia a cantinela

e o fogonear dos balaços,

meio de arrasto - c'os braços,

rumbeou para o tiroteio:

- galo fino - no careio,

coloreando de puaços...



Era um gaúcho Oriental

e um Oriental não recua,

honra a tradição charrua

e nem a morte o abala,

no próprio sangue resvala

mas segue no mesmo tranco,

agora, de ferro-branco,

porque jã não tem mais bala.



Sente que a vista falta

e uma bárbara dormência,

mas resta-lhe uma incumbência

nessa noite de Domingo,

se entrevera e - no respingo,

mete a adaga em carne humana,

gritando em voz insana:

- esta les doy por mi pingo!



Com vinte e tantos balaços,

escoriações e facadas,

as roupas esburacadas,

já cego - e peleando aos gritos,

como a confirmar os gritos

dalgum Confúncio campeiro:

- Covarde morre ligeiro,

o taura, morre aos pouquitos.



Três mortos - mais o Hermano

e o baio - morto encilhado,

não foi identificado

nem um só daquele trio,

o restante, se sumiu,

na imensidade campeira,

deixando apenas sangüeira

e o choro do vento frio.



Nunca se soube o motivo

daquela barbaridade,

nem a própria autoridade

nem gente da vizinhança.

Foi com certeza, vingança,

feita por gente mandada.

Restam na velha picada

quatro cruzes por lembrança.



Seus nomes nunca se soube,

três cruzes sem inscrição

defronte - noutro munchão,

uma cruz tem nome: Hermano.

Descansa nela o paisano

que usava melena preta,

um poncho azul de baeta,

montava um baio cabano.



E lá está a cruz de pau ferro

palanqueando o castelhano,

último adeus do Hermano,

na tarde triste e cinzenta,

ao ver a cruz - representa

que a gente vê - na lonjura,

seu olhar, misto ternura,

com lampejos dde tormenta.










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